"Como se tivéssemos largado a torneira aberta.
Por dias. Semanas. Ouvindo a água pingando.
Batendo na louça, dentro da pia, no ralo, durante a madrugada.
Mas como se tivéssemos tido preguiça de nos levantar da cama.
De deixar o quente das cobertas. Tirar a cabeça do travesseiro.
De calçar os chinelos e andar até a cozinha pra dar mais meio giro.
Apenas metade de uma outra volta que acabaria com o ruido.
Com o gasto de água. Com o barulho dos pingos caindo na louça.
No canto do prato. Na ponta da faca. No ralo, de madrugada.
Vazamento esvaziando o reservatório por descaso.
Litros e litros pelo cano por nossa culpa.
Não, não foi de repente.
Não foi surpresa.
Nosso amor secou aos poucos, gota a gota.
E nós ouvimos todos os pingos.
E não fizemos nada."
"Desamores" do Eduardo Baszczyn.
Como dói.